FÉRIAS E O 13º SALÁRIO DOS EMPREGADOS QUE TIVERAM SUSPENSÃO E/OU REDUÇÃO DO CONTRATO

 

FÉRIAS E O 13º SALÁRIO DOS EMPREGADOS QUE TIVERAM SUSPENSÃO E/OU REDUÇÃO DO CONTRATO

Diante da crise causada pela pandemia da COVID-19, o governo editou duas Medidas Provisórias que alteraram a rotina dos contratos de trabalho: as MP´s 927 e 936. A Medida Provisória nº 936/20, em especial, trouxe a possibilidade de empresas e trabalhadores fixarem a redução da jornada de trabalho com correspondente redução do salário e a suspensão do contrato de trabalho, com o recebimento do Benefício Emergencial.

Ocorre que, a MP nº 936/20 (convertida na Lei nº 14.020/2020) nada previu acerca dos efeitos da suspensão/redução em relação ao 13º salário e férias. Essa omissão causou uma suposta lacuna para empregados e empregadores, pois muitas teses foram levantadas, considerando a legislação trabalhista vigente, o que aflorou com a chegada da data para pagamento, especialmente, do décimo terceiro salário.

Visando afastar eventuais dúvida, a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia (que incorporou as funções do antigo Ministério do Trabalho e Emprego) editou a Nota Técnica SEI nº 51520/2020/ME. Por meio de ferida NT, o governo buscou analisar os efeitos dos acordos de suspensão do contrato de trabalho e de redução proporcional de jornada e de salário sobre o cálculo do 13º salário e das férias dos trabalhadores.

Impacto sobre o 13º Salário

A suspensão do contrato de trabalho tem como efeito, em regra, a suspensão das principais obrigações entre as partes. Cessa a prestação do serviço e o dever de remunerá-la e o referido período não conta como tempo de serviço.

Como é sabido, o 13º salário corresponde a 1/12 avos da remuneração devida em dezembro, por mês de serviço do ano correspondente. Ademais, a fração igual ou superior a 15 dias de trabalho será havida como mês integral para efeitos do cálculo do 13º salário.

Assim, em relação ao 13º salário, tem-se que a suspensão do contrato de trabalho ocorrida durante a pandemia exclui o respectivo mês para fins de cômputo dessa parcela salarial, caso não seja atingido o número mínimo de 15 dias de trabalho na forma da Lei nº 4.090/1962.

Já a redução proporcional de jornada e de salário, por sua vez, não tem impacto no cálculo do 13º salário, que é calculado com base na remuneração integral do mês de dezembro, assim considerada a remuneração sem influência das reduções temporárias de jornada e salário, conforme estabelece o §1º, art. 1º da Lei nº 4.090/62.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, por sua vez, ao analisar o processo, se manifestou da seguinte forma sobre efeitos dos períodos de suspensão do contrato de trabalho em relação ao 13º e férias:

“Conquanto a suspensão de contrato de trabalho prevista na Lei nº 14.020/20, não se amolde identicamente ao instituto regulado pelo art. 476-A, da CLT e esteja inserida em contexto temporário e excepcional, apresenta elementos comuns ao instituto geral da suspensão de contrato de que cuida o direito do trabalho, consubstanciados na cessação da prestação dos serviços e na correspondente cessação das obrigações contraprestacionais do empregador.
Não há determinação na Lei nº 14.020/20, em sentido contrário à teoria geral da suspensão do contrato de trabalho agasalhada pela legislação trabalhista, que imponha efeitos jurídicos diversos na contagem do tempo de suspensão do contrato de trabalho frente à cessação do labor, como tempo fictício de serviço para qualquer fim.
Sob o prisma de tratamento isonômico dos efeitos jurídicos do lay-off, tendo em conta que suas hipóteses caracterizadoras, independente das peculiaridades e do contexto típico de cada modalidade, pressupõem acordo de vontades com inerente suspensão da prestação de serviços e suspensão das correlatas obrigações contraprestacionais do empregador, não parece haver critério de discriminação válido que possa imprimir efeitos diversos a tal instituto, a menos que haja deliberação válida das partes em sentido contrário, mais favoráveis, ou que não se qualifique como suspensão, mas interrupção do contrato de trabalho, a qual absolutamente não é a hipótese negocial excepcional em deslinde, posto que prevista expressamente como suspensão do contrato pela Lei nº 14.020/20.
Vale citar que, mesmo para fins previdenciários, a suspensão de contrato de trabalho trazida pela Lei nº 14.020, de 2020, não enseja, em regra, a contagem de tempo de serviço ou tempo de contribuição, eis que a citada legislação excepcional viabilizou a contribuição facultativa ao trabalhador segurado que negociar a suspensão do contrato de trabalho, para fins de garantia de contagem do tempo de contribuição, consoante se extrai do seu art. art. 8°, parágrafo 2°, II.
Do mesmo modo, o período de suspensão do contrato de trabalho celebrado com base na referida lei não poderia, por si só, acarretar na consideração para contagem de tempo de serviço no campo trabalhista, impactando, por consequência, salvo disposição mais favorável em acordo individual ou negociação coletiva (§1º do art. 8º), para fins de período aquisitivo de férias e também no cálculo do 13º salário, observado o critério fixado no art. 1º da Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962.
Quanto à gratificação salarial natalina, de fato, o §1º do art. 1º da Lei nº 4.090, de 1962, prevê que corresponderá a 1/12 da remuneração devida em dezembro, por mês de serviço, no ano correspondente. O §2º, por seu turno, estabelece que a fração igual ou superior a 15 (quinze) dias de trabalho será havida como mês integral para os efeitos do cálculo do §1º:
(…)
Nesse sentido, quando o período de suspensão contratual, no mês, for superior a 15 dias, o período não é computado para fins de pagamento do 13º salário, a teor da regra fixada no §2º do art. 1º da Lei nº 4.090, de 1962.
(…)
Deve-se registrar, no entanto, que no campo da aplicação da norma mais favorável ao trabalhador não há óbice para que as partes estipulem, via convenção coletiva de trabalho, acordo coletivo de trabalho ou acordo individual escrito, ou mesmo por liberalidade do empregador, concessão de pagamento da citada verba remuneratória ou respectiva contagem do tempo de serviço, inclusive no campo do instituto das férias, durante o período da suspensão contratual temporária e excepcional (art. 8º, §1º da Lei nº Lei nº 14.020, de 2020).”

Impacto sobre as Férias

Considerando que a suspensão do contrato de trabalho suspende os efeitos patrimoniais dos contratos, os períodos de suspensão do contrato de trabalho não são computados para fins de período aquisitivo de férias, e o direito de gozo somente ocorrerá quando completado o período aquisitivo, observada a vigência efetiva do contrato de trabalho.

Por sua vez, a vigência de acordo de redução proporcional de jornada e de salário não tem impacto sobre o pagamento da remuneração de férias e adicional de férias, porquanto essas parcelas devem ser calculadas considerando o mês de gozo, conforme determina o artigo 145 c.c o artigo 142 do Decreto-Lei n. 5.452 de 1º de maio de 1962.

Entende-se que a posição do Ministério da Economia está corretamente fundamentada e traz segurança jurídica para as empresas. Vale frisar que esse posicionamento era o que vinha sendo divulgado pelos especialistas na área trabalhista, por representar uma interpretação sistemática, o mais equilibrado dentro da relação de emprego, especialmente porque a decretação de um estado de calamidade pública vai além do poder diretivo do empregador, não devendo este suportar sozinho os efeitos da pandemia.

Sobre os efeitos dos acordos de redução proporcional de jornada e de salário, a PGFN entendeu da seguinte forma:

“Como bem pontua a Nota Técnica SEI nº 47133/2020/ME, trata-se de hipótese complexa a exigir “interpretação lógico-sistemática das normas em vigor para a correta aplicação do regramento jurídico”, isso porque, diversamente da hipótese de suspensão do contrato de trabalho, aqui o contrato de trabalho permanece em execução, com prestação de serviços e com as obrigações de correlatas de contraprestação do empregador.
(…)
Destaca-se inicialmente a preocupação, notadamente, quanto à gratificação natalina na situação em que as reduções de jornada e salário se verificarem no mês de dezembro.
Isso porque, de forma geral, a Lei nº 4.090, de 1962, prevê que o 13º salário terá como base de cálculo a remuneração devida ao empregado no mês de dezembro, o que, considerando a sua redação expressa, poderia levar à conclusão de que se o empregado estiver com a remuneração reduzida no mês de dezembro, por força da hipótese da Lei 14.020, de 2020, a gratificação salarial natalina seria calculada com base no valor reduzido.
Todavia, a ausência de norma expressa na Lei nº 14.020, de 2020, em relação a esse ponto, aliada à situação vivenciada em decorrência do estado de calamidade considerado, dão margem ao surgimento de interpretações diversas que buscam compatibilizar a legislação com a situação de emergência de saúde pública.
Nesse sentido, ultrapassando a interpretação literal, vislumbra-se possível trilhar hermenêutica na linha de que a base de cálculo do 13º salário deve considerar o valor contratual sem incidência da redução proporcional implementada pelo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda trazido, temporária e excepcionalmente, no contexto da Lei 14.020, de 2020. Tal diretriz atrela-se ao objetivo maior do legislador ao instituir o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, que tem como finalidade precípua preservar o emprego e a renda do trabalhador, além de garantir a continuidade das atividades laborais e empresariais e reduzir o impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade pública e da emergência de saúde pública (art. 2º, Lei nº 14.020, de 2020), afastando-se a pretensão de estender as possíveis medidas emergenciais para outros direitos trabalhistas que não os especificamente listados na norma.
Assim, pode-se argumentar que a mens legis não seria reduzir direitos dos trabalhadores, mas criar mecanismos para manutenção dos empregos na vigência do decreto de calamidade pública, não implicando a lei na alteração da forma de cálculo de verba trabalhista prevista na legislação ordinária fora do campo das medidas emergenciais em termos excepcionais que veicula, como a de redução de jornada e de salário a par de pagamento de benefício financeiro custeado pelo Poder Público diante das situações nela consignadas.
Dito isto, apresenta-se juridicamente viável o caminho interpretativo no sentido de que o cálculo da gratificação natalina (décimo terceiro salário) deve ter como base de cálculo o valor da remuneração do trabalhador sem incidência das reduções previstas na Lei 14.020, de 2020.
Seguem o mesmo rumo interpretativo, além do cálculo do décimo terceiro salário, também a remuneração das férias e do terço constitucional dos empregados beneficiados pelo BEm, conforme previsão na minuta analisada, dado que são institutos jurídico-laborais que não ingressaram no escopo dos efeitos da redução de jornada e de salário de que trata a Lei nº 14.020, de 2020.
Tratando-se, todavia de adoção de linha interpretativa em campo fluido deixado pela legislação, não se pode olvidar de eventuais riscos jurídicos da interpretação em lume que fundamenta a proposta normativa ordinatória em análise, posto que não há parâmetros para prever a direção que a jurisprudência dos Tribunais irá seguir, sendo certo que a edição de lei com a previsão expressa contemplando a presente diretriz interpretativa seria a opção mais adequada para garantir maior segurança jurídica aos empregados, empregadores e operadores do direito.”

Nota do Ministério Público do Trabalho

Afora a orientação do Ministério da economia, o Ministério Público do Trabalho – MPT, através de seu Grupo de Trabalho – GT COVID-19, também proferiu uma Diretriz Orientativa acerca destes dois temas.

E, apesar de o MPT ter como atribuição fiscalizar o cumprimento da legislação trabalhista, acaba muitas vezes conferindo interpretação diversa daquela que a própria legislação apresenta, atuando como verdadeiro defensor da parte (in dubio pro operario) e não da lei.

Segundo defende o MPT, tanto nos casos de suspensão do contrato de trabalho quanto de redução de jornada/salário, não há influência no cálculo nem do décimo terceiro salário, tampouco do período aquisitivo de férias. Com base nesse entendimento, sugere que seja realizado o pagamento integral do décimo terceiro e a inclusão, para fins de contagem do período aquisitivo, do período de afastamento ou redução da jornada, já que entende que estes afastamentos foram justificados por lei.

Entendemos que o MPT ignora os efeitos da suspensão do contrato de trabalho, conferindo a esse período um tratamento equivocado. Ao não admitir os reflexos das suspensões contratuais sobre o décimo terceiro e férias, o MPT vai contra a natureza jurídica dos institutos, vai contra a lei, vai contra a regra que estabelece que as referidas verbas serão pagas de acordo com os meses trabalhados, descontando-se os meses de suspensão.

Liberalidade

Independentemente das manifestações do ME e do MPT, a empresa poderá efetuar o pagamento integral do 13º salário e considerar os meses de suspensão para fins de computo no período aquisitivo de concessão de férias, mormente porque tal condição é mais benéfica ao empregado.

Conclusão

Sopesando os argumentos existentes, entendemos que:

(i) a suspensão do contrato de trabalho ocorrida durante a pandemia exclui o respectivo mês para fins de cômputo dessa parcela na apuração do 13º Salário;

(ii) os meses que foram trabalhados ao menos por 15 dias, deverão ser computados para fins do 13º Salário;

(iii) a base de cálculo do 13º salário deve ser o valor da remuneração paga em dezembro, independentemente de suspensão/redução;

(iv) a redução de jornada/salário não interfere no cálculo do 13º salário;

(v) os meses de suspensão do contrato de trabalho não são computados para fins de período aquisitivo de férias;

(vi) a redução proporcional de jornada/salário não interfere sobre o pagamento da remuneração de férias e adicional de férias (que são calculadas no mês de gozo);

 

FONTE : SB ADVOCACIA